Uma reforma elétrica exige planejamento técnico detalhado, análise de risco e conformidade normativa para garantir segurança, desempenho e legalidade da instalação. A intervenção deve priorizar a adequação ao sistema de distribuição existente, a substituição de componentes obsoletos e a mitigação de riscos elétricos por meio de adequação de aterramento, proteção diferencial e contra surtos, dimensionamento de condutores e dispositivos de proteção, e documentação técnica com ART assinada por profissional habilitado.
Uma reforma elétrica resolve problemas reais: riscos de choque e incêndio, insuficiência de capacidade, quedas de tensão, desequilíbrio de fases, alto consumo devido a fator de potência indesejado e falta de seletividade entre proteções. Do ponto de vista normativo e legal, a reforma fornece a documentação necessária para conformidade junto a órgãos de fiscalização e concessionária, e permite a emissão da ART conforme exigido pelo CREA.
O escopo deve incluir levantamento de cargas reais, atualização do quadro de distribuição, implantação ou revisão de DR (dispositivo diferencial residual) e DPS (dispositivo de proteção contra surtos), revisão do sistema de aterramento, verificação do dimensionamento de cabos e dispositivos de manobra/proteção, verificação e correção do balanceamento de cargas e apresentação de projeto executivo e laudos de ensaio.
As principais referências normativas brasileiras para reformas em instalações de baixa tensão são a NBR 5410 (Instalações elétricas de baixa tensão) e, quando pertinentes, a NBR 14039 (Instalações elétricas de média tensão — aplicações industriais e similares). Para segurança do trabalho aplicam-se os requisitos da NR-10. Todas as soluções propostas devem manter conformidade com essas normas e com as instruções da concessionária local.
Qualquer reforma deve ser representada por projeto e relatório técnico assinados por engenheiro eletricista, com emissão de ART. A documentação mínima inclui: diagrama unifilar atualizado, memorial de cálculo (dimensionamento de condutores, queda de tensão, corrente de curto-circuito), lista de materiais com especificações técnicas, e procedimentos de ensaio e manutenção. Para alterações que impliquem aumento de carga ou mudança de característi cas do ponto de entrega, é obrigatório contato e autorização da concessionária.
Realizar levantamento detalhado de cargas por circuito (iluminação, tomadas, ar-condicionado, motores, cargas especiais). Classificar cargas quanto a natureza — contínua, intermitente, partida de motores, cargas sensíveis — e identificar cargas críticas que demandem alimentação ininterrupta.
Calcular a corrente de projeto com base nas potências nominais e nos fatores de demanda aplicáveis. Aplicar fatores de diversidade conforme NBR 5410 e diretrizes da engenharia de instalações para estabelecer a carga de projeto do quadro principal e dos barramentos. Esse cálculo orienta a escolha do disjuntor geral e eventual upgrade do condutor de entrada ou do transformador.
O dimensionamento deve atender ao critério de condução de corrente (Iz ≥ Ib), à capacidade de curto-circuito e ao limite de queda de tensão admissível. Considerar fatores de correção por agrupamento, temperatura ambiente e orientação (condutos, bandejas). Utilizar tabelas de capacidade de corrente conforme NBR 5410 e fabricantes de cabos. Verificar a resistência mecânica e a necessidade de condutores de proteção equipotencial.
Estabelecer limites de queda de tensão de acordo com o uso final e com requisitos do fabricante dos equipamentos. Em projeto de reforma, recomenda-se visar valores típicos de engenharia: manter a queda de tensão máxima entre o ponto de entrega e a carga crítica dentro de faixas conservadoras (p.ex. até 3–4% para circuitos de potência/iluminação), lembrando que requisitos específicos de equipamento podem exigir limites mais restritos. Documentar cálculo da queda de tensão e justificar escolhas.
Selecionar dispositivos com critérios de seletividade e capacidade de ruptura superiores à corrente de curto-circuito prevista. Para disjuntores e fusíveis, definir curvas de atuação e coordenação temporal (selectividade) com base em estudos de curto-circuito e coordenação de proteção. Para circuitos motorizados, aplicar curvas e ajustes que permitam inrush de partida sem operação indevida, preservando proteção contra sobrecarga e curto.

A escolha entre sistema TN-S, TN-C-S e TT deve considerar a condição da concessionária, exigências normativas e estudo de proteção. A NBR 5410 define critérios de proteção e a necessidade de condutores de proteção e equipotencialização. Em reformas residenciais, o sistema TN-C-S é comum, mas sua implantação exige análise das condições do neutro da concessionária e da continuidade do condutor PEN.

Dimensionar o condutor de proteção (PE) conforme NBR 5410 e assegurar continuidade elétrica em todas as massas. Projetar o sistema de eletrodos de aterramento considerando resistência de aterramento adequada ao tipo de instalação. Embora a NBR 5410 não fixe um valor único para resistência, a prática de engenharia recomenda valores baixos (p.ex. ≤ 10 Ω) para garantir funcionamento eficaz de dispositivos de proteção e estabilidade do potencial de referência; instalações críticas demandam valores menores e projeto específico.
Implantar DR conforme exigências normativas: sensibilidade de 30 mA para proteção contra choques em circuitos utilizados por pessoas (tomadas, áreas molhadas); 300 mA para proteção contra incêndio em entrada de serviço quando requerido. Selecionar tipos de DR (AC, A, B) conforme natureza das correntes residuais previstas (presença de componentes contínuos ou harmônicos). Avaliar necessidade de proteção sensível em circuitos com equipamentos eletrônicos e evitar despontamentos indevidos por correntes de fuga normais.
Elaborar estratégia de proteção em níveis: DPS Tipo 1 próximo ao cabeamento de entrada (quando há risco de impacto direto de descarga atmosférica e instalação de pára-raios externa), Tipo 2 no quadro de distribuição (Proteção contra surtos induzidos e transitórios da rede), e Tipo 3 no ponto de utilização para eletrônicos sensíveis. A seleção do nível de proteção (Up), corrente nominal de descarga (In) e capacidade máxima (Imax) deve ser compatível com o sistema e com as características de aterramento.
Assegurar coordenação entre DPS e dispositivos de proteção contra sobrecorrente para evitar que um DPS danificado provoque operação indevida de fusíveis/disjuntores. Dispositivos com componentes de baixa impedância demandam dispositivos de proteção diferenciados e, frequentemente, se instalam conjuntos com seccionamento e fusíveis coordenados.
Dimensionar proteções térmicas e de sobrecorrente considerando o fator de serviço do motor e o perfil de partida. Utilizar relés de sobrecarga ajustáveis, contatores com capacidade de inrush e, quando apropriado, soft-starters ou inversores de frequência (VFD) para reduzir impactos na rede e melhorar a vida útil mecânica. Garantir proteção contra subtensão, sobretensão e falhas de fase.
Analisar o fator de potência e propor bancos de capacitores com controle automático quando o valor médio justificável provoque penalidades tarifárias ou sobrecarga térmica. Avaliar a presença de distorções harmônicas antes de instalar capacitores; em redes com altos níveis de harmônicos, a instalação direta de capacitores pode provocar ressonância e sobrecorrentes. Nesses casos, projetar filtros passivos (com reatância de detunagem adequada) ou soluções ativas.
Executar medição de forma de onda, DHT (distortion harmonic total), contentores de harmônicas e flutuações de tensão. Para cargas não lineares (inversores, UPS, retificadores) dimensionar soluções de mitigação: filtros passivos ou ativos, transformadores de isolamento, e especificação de capacitores com filtros. A reforma deve incluir estudo de compatibilidade eletromagnética para proteger equipamentos sensíveis.
Durante a execução, seguir procedimentos que incluam identificação e segregação de circuitos, instalação correta de barramentos e conexões aparafusadas com torque controlado, passagem de condutores por eletrodutos e bandejas de acordo com método previsto, e separação entre circuitos de potência, controle e comunicação quando aplicável.
Realizar ensaios antes da energização final: continuidade dos condutores de proteção, medição de resistência de aterramento, medição de resistência de isolamento (usualmente com megômetro a tensão apropriada), verificação de polaridade e sequência de fases, ensaio de disjuntores e testes funcionais dos DR (teste de operação), e medição de queda de tensão em carga simulada. Registrar todos os ensaios em relatórios assinados pelo responsável técnico.
Aplicar integralmente os requisitos da NR-10: avaliação de risco, planejamento da intervenção, permissão de trabalho, uso de EPI/ EPC adequados, sinalização, isolamento da fonte de energia e procedimentos de bloqueo/etiquetado ( Lockout/Tagout). Operações em tensão só devem ocorrer quando justificadamente necessárias e com pessoal qualificado, seguindo medidas adicionais de segurança.
Garantir que todos os envolvidos na reforma possuam treinamento compatível com as atividades (NR-10 e treinamentos práticos) e que exista responsável técnico em obras com assinatura da ART. Registrar instruções de operação e emergência para o usuário final e equipe de manutenção.
Estabelecer plano de manutenção com inspeções periódicas, incluindo: termografia por infravermelho para identificação de conexões aquecidas, verificação de torque em conexões, limpeza de quadros, inspeção visual de cabos e eletrodutos, verificação de funcionamento de DR e DPS, e ensaios de resistência de isolamento e aterramento conforme criticidade. Recomenda-se inspeção inicial após 3–6 meses da reforma e periodicidade anual para instalações prediais; instalações críticas devem ter manutenção semestral ou contínua via contrato especializado.
Manter registro dos ensaios e medições, histórico de intervenções e um plano de manutenção. Usar indicadores como temperatura de conexão, tendências de resistência de aterramento e níveis de DHT para antecipar ações corretivas.
Durante a reforma, aproveitar para implementar modernizações que aumentem eficiência e segurança: iluminação LED com controle; medição e gestão de energia (smart metering); automação de quadros (supervisão SCADA ou BMS em edifícios); instalação de UPS para cargas críticas; e integração de sistemas fotovoltaicos com proteção e inversores certificados.
Se houver intenção de integrar geração fotovoltaica ou outra fonte distribuída, projetar interface conforme regras da concessionária e normas técnicas aplicáveis (procedimentos de interconexão). Considerar controle anti-ilhamento, coordenação de proteção e impacto no fator de potência e harmônicas.
Uma reforma bem projetada corrige riscos como: sobreaquecimento por conexões mal dimensionadas, ausência de proteção diferencial, riscos de incêndio por cabos subdimensionados ou envelhecidos, quedas de tensão que afetam equipamentos sensíveis, ausência de proteção contra surtos, e problemas legais relacionados a documentação e segurança.
Em suma, a reforma elétrica deve ser tratada como projeto de engenharia completo: levantamento de cargas, projeto executivo conforme NBR 5410 (e NBR 14039 quando aplicável), estudo de proteção e coordenação, dimensionamento adequado de condutores e dispositivos, projeto de aterramento e DPS, emissão de ART e plano de ensaios e manutenção. A conformidade com NR-10 garante segurança das equipes durante execução e manutenção.
Seguir estas diretrizes técnicas e normativas assegura que a reforma elétrica atenda aos requisitos de segurança, desempenho e conformidade, reduzindo riscos e garantindo vida útil prolongada dos ativos elétricos. A execução criteriosa do projeto, aliada ao acompanhamento por profissional habilitado, é condição essencial para validade técnica e legal da intervenção.